Friday, September 21, 2007

TEXTO QUE LI EM UM SITE...

A linguagem do coicebol

Por Pasquale Cipro Neto

Manifestar-se favoravelmente a um agressor não é fazer a apologia da violência?

VOLTA E MEIA, vestibulares de importantes instituições apresentam questões em que se pede aos candidatos a leitura das entrelinhas de um texto, de um pronunciamento etc. Esse tipo de questão avalia a capacidade do aluno de efetivamente compreender o que lê, de tirar suas próprias conclusões, de enxergar o que está "oculto", de captar as subliminaridades etc.

Em tempos escuros como estes (refiro-me ao nauseante "politicamente correto", verdadeiro neomacarthismo da linguagem e do pensamento, que faz ver chifre em cabeça de cavalo, enxergar idéias que nem de longe estão presentes nos textos, nos pronunciamentos), essa espécie de questão, se mal formulada, pode dar asas à "criatividade" de bancas ávidas por meter os pés pelas mãos.

Felizmente, não é o que tem ocorrido -é bom que se diga. Em geral, as questões não esbarram no rés-do-chão do proselitismo vulgar, embora vez por outra se veja algum delírio.

Posto isso, permito-me trocar com o leitor duas palavras sobre a "leitura" de parte do que se escreveu/ouviu depois do que ocorreu domingo, no Mineirão, no grande "clássico das alterosas" (Cruzeiro x Atlético). Lá pelas tantas, o jogador Kerlon levantou a bola com o pé direito, levou-a à cabeça e seguiu em direção à área adversária. Foi "contido" por um megabrucutu, que, guiado por seu espírito e alma de ser das trevas, agrediu o hábil Foquinha.

O que se ouviu depois disso foi um festival de insanidades. Falou-se do "código de ética" dos "boleiros", que, por sinal, em muito se assemelha ao da bandidagem. Neste, por exemplo, matar "pode", mas estuprar "não pode" (?!?!?!). No "código" dos "boleiros", admite-se o diabo (não preciso entrar em detalhes, creio), mas não se admitem pedaladas e focadas, por exemplo. Em 2002, quando Robinho encantou os que de fato gostam de arte, digo, de futebol, deu-se o mesmo (mentes brilhantes defendendo pernas-de-pau agressores).

Desta vez, a coisa não foi diferente. Vá lá que toscas almas penadas do submundo (e ponha submundo nisso!) do futebol profiram disparates. É típico do meio, tristemente formado por uma copiosa quantidade de ignorantes e pobres de espírito. Mas é inaceitável que alguns profissionais da imprensa defendam o "legítimo direito de defesa" do jogador "que se sentiu ofendido, humilhado". Em outras palavras, esse "legítimo direito de defesa" significa o direito de agredir, aleijar ou matar.

Permito-me perguntar (afinal perguntar não ofende): se é crime fazer a apologia da violência, por que não enquadrar quem se manifestou favoravelmente aos agressores do Mineirão? Isso não é disseminar a "teoria" de que há "códigos" que estão acima da lei? A lei, no caso, são as regras do futebol. Se Kerlon tivesse violado uma delas (e não burlou coisíssima nenhuma -basta lê-las para que se veja que nada o impede de fazer o que fez), que se aplicasse o que prevêem essas regras. E basta.

A linguagem da violência, caro leitor, não é só verbal. É também não-verbal. Expressa-se por repertório vário de signos -como cones e cavaletes (que, com o beneplácito das "autoridades", transformam em privado o que é público) ou coices em quem tem talento, desferidos por coelhos e outros bichos, em cuja defesa saem leões e outras feras.

É isso.

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